Certo dia olhei o violão da minha irmã esquecido num canto e pensei: “bem que eu podia…”. Comecei a fuçar, conhecer o som das cordas, bem que tentei fazer um acorde, mas parecia impossível. Imprimi uma cifra e copiei o desenho, colocando os dedos desajeitados nos “quadradinhos” indicados. Passar de dó pra sol levou um tempo. Minha mãe passava no corredor e dizia “nossa, não tem música nenhuma aí!”, mas aquilo me divertia. Depois de conseguir fazer os acordes básicos e passar de um para o outro, comecei a miar enquanto tocava. Aos poucos fui me soltando, cantando mais alto, aprendendo músicas novas. Minha mãe já gostava de ouvir e insistia para que eu cantasse para os outros. Não gostava muito disso porque minha relação com a música era (e é) bem particular, íntima, pessoal e todos os sinônimos que se possa encontrar.
Comecei a compor com cerca de 16 anos. Uma música aqui, outra ali. Mas o caderno escrito a lápis começou a se encher alguns anos depois. Com o tempo vêm novas experiências e ideias, por vezes fortes demais, mesmo em sua simplicidade, para ficarem retidas. As pessoas têm formas diferentes de se expressar e a arte é uma das mais usadas. Não tenho pretensão alguma com relação às minhas músicas. Não as fiz querendo que fossem belas, que agradassem aos outros, que fizessem sucesso ou me deixassem rica. Às vezes algumas pessoas me questionam porque não penso em viver de música (muito gentis, pois esse é um elogio e tanto, já que consideram essa hipótese). Respondo que a música é tão importante pra mim, tão sagrada, que não quero transformá-la em preocupação, em sustento. Estudei Relações Internacionais e Direito Internacional. É uma área difícil, eu sei, mas ainda penso em seguir em frente. O melhor disso tudo é que a música é uma ferramenta perfeitamente utilizável no que eu quero fazer. Apesar do incentivo de amigos e da família, não quis gravar até eu mesma sentir que deveria. E quis porque as ideias surgiam, tocava instrumentos mentalmente, as melodias iam aparecendo e a brincadeira no computador não era mais suficiente. Queria que nascessem, de fato. Queria vê-las existindo por si só, não apenas quando sentava na cama tarde da noite e as cantava com voz baixa para não acordar a família (e os vizinhos), como que ninando a mim mesma.
Leopoldo Bretz: backing vocals |
Madruga Bretz: backing vocals 2 |
São músicas simples e sinceras. Na verdade eu queria ser dona de um estúdio e saber tocar uns 10 intrumentos. Assim poderia brincar com elas, experimentar, viajar… Bom, no fim das contas fiz um pouco isso, mas só na cabeça. Um detalhe que eu esqueci de mencionar é que eu só descobri de fato como elas eram quando foram gravadas. Loucura, eu sei. Não teve pré-produção. Fiz os arranjos (na verdade a maior parte deles, algumas coisas foram feitas por outras pessoas). Outra loucura, convenhamos. Lembro dos dias em que o Douglas vinha em casa para ensaiar, mas na verdade a maioria do tempo consistia na minha pessoa cantarolando e tocando frases na escaleta para que ele transformasse em partitura, que ele mesmo leria enquanto tocava violoncelo. Lembro direitinho do primeiro dia, quando ele escreveu a partitura do que eu escrevi para “Saudade” e tocamos juntos pela primeira vez. Comecei a rir (literalmente) daquilo, tinha saído da minha cabeça e ganhado vida. Também me lembro da sensação que tive quando, depois de alguns takes, o Túlio executou a bateria do finalzinho de “Come Along” do jeitiiiiinho que eu pensava, expressando o que eu queria expressar. Cada linha que o Pro-Tools ganhava era uma parte das ideias chegando ao mundo. Nem sempre como eu imaginava, claro. Tivemos alguns probleminhas, nem tudo funcionou. Também pudera! Já acho um milagre ter saído o que saiu. Só possível com a boa vontade de muita gente.
Não sei, só sei que foi assim. Estou feliz com o resultado. 🙂
Túlio Maktvh: batucações e bateria |
Mentiria se eu dissesse que não quero vender. As coisas custam dinheiros ($$$), não é fácil não. Mas que fique claro que não é o propósito central disso tudo. Além disso, é legal ver uma música que você fez chegar em lugares que você nunca imaginou (mesmo porque tenho amigos em vários lugares). Aproveito para dizer que não espero causar em ninguém o que eu senti quando ouvi “Lover you should’ve come over” do Jeff Buckley pela primeira vez, assim, passando direto por mim, sem necessidade de uma segunda audição para digestão; absorvida, sentida em cada nota. Não espero causar em ninguém tudo o que eu ja senti enquanto ouvia Damien Rice. Não teria tamanha ousadia. Não espero despertar o que me despertam The Swell Season, Nick Drake, CSNY, Lisa Hannigan e tantos outros que têm me acompanhado. Nunca me chamei de “cantora”. Fiz esse disco pra mim. Mas se alguém se sentir conectado com alguma delas, vou ficar feliz e honrada. Quer dizer que nossas almas já passearam pelos mesmos lados.
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