Eu disse “em breve”? O que é isso que a vida faz conosco? Eu simplesmente não consigo acreditar que já faz um mês que cheguei em casa.
Bom, nem sei o que dizer. Esse tempo em Moçambique foi realmente um divisor de águas na minha vida. Eu já me considerava uma pessoa simples, mas creio que evoluí muito nesse quesito. Não precisamos de tantas roupas, não precisamos fazer tanta frescura com o que tem pra comer em casa. A rotina diária nos destrói. Trabalhar, chegar em casa, descansar, trabalhar, chegar em casa… Há TANTO pra ver, ouvir, cheirar, aprender. Tanto que me dá agonia em saber que uma vida inteira não é suficiente para conhecer tudo que esse mundo oferece. Sendo assim, a solução é tentar aquietar o coração e fazer o possível dentro das nossas possibilidades, além de tentar sempre expandi-las.
Eu não tinha dinheiro para ir pra Moçambique, assim “do nada”. Trabalhei de algumas formas, com a ajuda do UNI-BH fiz um show no Teatro Ney Soares e lá arrecadei muito do que precisava. Eu não tinha 3.500 lápis para levar. Amigos e amigos de amigos foram os responsáveis por tudo isso. Recebi e-mails e mensagens de gente que não sei de onde surgiu, querendo doar. O ser humano tem uma capacidade absurdamente gigantesca de provocar mudança.
Eu acredito que todos os dias temos duas opções ao acordar: reclamar da vida ou sorrir e fazer daquele um dia especial. É como o lema do AA, “só por hoje”. Dar valor às coisas belas e simples da vida. Podemos escolher ser falsos ou verdadeiros, egoístas ou altruístas. Podemos escolher fazer alguém se sentir especial ou ignorar a todos, pensando nos nossos próprios problemas. E que problemas? Tempestade em copo d’água é o que não falta. Depois de ver tantas crianças com responsabilidade de gente grande, trabalhando de pé descalço, fazendo comida, carregando coisas pesadas, bebês no colo e andando distâncias intermináveis, acho que não vou mais reclamar de ter preguiça de levar o lixo pra rua.
Aos que leram todos os posts, vocês podem ter pensado: nossa, mas quanta alegria e diversão! Mas vi muitas coisas tristes, também. Mas isso é o que todo mundo fala, é o estereótipo da África e NÃO era o que eu queria transmitir. Temos que adotar a cultura da paz. Isso não significa ignorar as coisas ruins, mas dar mais atenção às boas. Os jornais (tv, rádio, impresso, tudo) pingam sangue, se torcermos igual roupa. Tem muita coisa linda acontecendo.Vi tanta, tanta, tanta beleza naquele lugar. Belezas naturais, sorrisos iluminados, música, dança, palmas, brincadeiras, gargalhadas… Senti tanto amor naqueles dias. Isso é o que ficou. Claro que nasceu em mim uma vontade ainda maior de ajudar e tentar contribuir para que esses problemas tão tristes sejam vencidos. Mas o que criou raiz foi a gratidão pela oportunidade de conhecer essas pessoas tão lindas, com uma cultura riquíssima e inspiradora. Gratidão por terem feito de mim uma pessoa um pouco melhor.
Depois dessa viagem quero me esforçar ainda mais pra conhecer coisas novas. É lindo e vicia. Pode ser os bairros de BH, as cidades de Minas, os Estados do Brasil, a América Latina, o mundo, Marte. Mas quero o contato próximo, quero aprender com eles. As conversas com os moçambicanos foram os momentos mais especiais. Num dos vilarejos, ensinando as mochilas, duas mães conversavam com as crianças do outro lado. Falavam em dialeto e eu não entendia nadinha. Comecei a brincar, dizendo que estavam falando mal de mim. Riram e comecei a perguntar várias palavras e expressões pra eles, numa conversa gostosa de fim de tarde. Eu as repetia bem alto, fazendo graça. Alguns que estavam mais longe começaram a rir também. Senti-me importante, fazendo-os rir do meu sotaque ao falar sua língua. Ou era da situação em si que riam, não sei ao certo. Sei que por causa daquele dia agora posso dizer: inini nokuda (eu te amo), Moçambique!
As outras palavras vão conhecer quando virarem canção.
Namíbia. Último pedacinho da África que vi. |